Beth Staub: “Minha palavra continua sendo gratidão”
Conheci a Maria logo no começo, quando vinha a SP de vinte em vinte dias. Escutando o Marcelo dar seu depoimento de fé, comentei com ele sobre uma síndrome degenerativa que tenho, e que gostaria de conhecer essa pessoa. Isso foi em um sábado. No sábado seguinte lá estava a Maria, com a Tânia e outros fraternistas na minha casa. Eu, bem desconfiada, quase não falei nada.
E ali estava a Maria, ajoelhada na minha sala. Cantou a Ave-Maria e comecei a chorar muito, chorei todo atendimento, não falei uma só palavra. A Maria se foi e toda sujeira embaixo dos tapetes começaram a vir à tona.
Encontrei a Maria mais umas 5 vezes, e não falava nada. Um dia, na hora de dar tchau, eu disse no seu ouvido: ”Você sabe que vou começar a falar”.
E assim foi. Conheci a Kitty em um destes encontros, amor a primeira vista, uma pessoa como a gente, que fumava e falava alguns palavrões. Confesso que senti um alívio por saber que não seria julgada. E uma sementinha chamada FÉ foi plantada. Pra mim, isso era a coisa mais absurda do mundo. Fui criada numa família espírita, frequentava colégio católico, ainda ia na Seicho-No-Ie e a um terreiro de umbanda… minha fé era o samba do crioulo doido.
Um dia, nestas reuniões, alguém perguntou onde arrumariam obreiros. A Maria virou e me apontou. Eu quase cai da cadeira e pensei: “bem doida esta Maria”. Bem, doida era eu, que não tinha ideia do que viria pela frente.
Minha vida virou um caos. De uma cobertura do Morumbi fui morar no centro de SP, vizinha da Cracolândia.
Uma dificuldade absurda. A Maria pediu para Kitty levar uma cesta básica. Era Páscoa, além de mantimentos levou chocolates para todos. E um quadrinho do Chico com a frase: “Embora ninguém possa voltar atrás e fazer um novo começo, qualquer um pode começar agora e fazer um novo fim”.
Naquele apartamento as coisas só ficavam mais confusas. Minha filha queria sair de casa, Maria falava para deixar, eu não acreditava. Um dia, depois de uma briga horrorosa, minha filha se foi. Chorei durante uma semana e falava com a Maria o tempo todo. E ela falava: “Viu? A Equipe alertou que você devia ter deixado ela ir, ela foi”.
Alguns meses depois, mudamos para um apartamento mínimo, mas em um lugar muito melhor. Uma semana de casa nova e meu marido foi embora, sem aviso prévio. Simplesmente foi. E nesta época eu falava o dia inteiro com a Maria. Eu cheia de dor, não conseguia pensar em outra coisa. Fazia cinco coisas: chorava, vomitava, passava noites em claro, fumava e ligava para Maria.
Comecei a frequentar as reuniões de aprendizado na casa da Kitty. Nossa reunião era às 20:00
Eu chegava às 4:00, chorava das 4:00 às 6:00, depois a Kitty fazia um lanche – nesta época já tinha perdido uns 7 quilos. As reuniões começaram mudar tudo dentro de mim. Mas ainda chorava, vomitava e ligava o dia todo para Maria.
No meio disso, a Maria foi me dando algumas tarefas, reconciliação de familiares, perdão do meu pai antes do morrer, doar amor a meus irmãos…tarefas difíceis mas cumpridas com louvor.
Nesta época já acompanhava a Maria e a Kitty nos lares. A Kitty falava: “se você conseguir esperar até o terceiro lar para começar a falar de seus problemas, ganha uma medalha”. Assim ia, entendia algumas coisas, outras não entendia.
Consegui fazer tudo o que a Maria pediu, mas o que eu mais queria na época não consegui…refazer meu casamento. A equipe via volta, mas sempre alertava que cada um faz suas escolhas. Na época que fui me despedir de meu pai, o meu ex terminou tudo de vez. Passei horas chorando com a Maria no telefone. E falava: consegui fazer tudo para todos, só para mim não consigo fazer nada.
De volta a SP, tive dias de dor e mais dor. Com dez quilos a menos, não quis mais viver. Tomei vários remédios, minha filha apareceu sem avisar e me salvou. Maria estava em SP, estava em uma lanchonete com a Kitty, teria tempo para o próximo atendimento, o Efigênio mandou ela ir para sede que alguém precisava muito ser atendida. E esse alguém era eu, em um táxi que chegou atrás do carro da Kitty. Fiquei deitada e chorando umas duas horas. Efigênio, triste, disse: “Você vai conseguir acabar com sua vida. Pare com isso”.
Saí da sala e passei 3 dias com a Maria na casa da Kitty. Fui sem roupa, sem um centavo. Foi a primeira vez que comi sem vomitar, ganhei minha primeira camiseta da Fraternitas. Nunca mais chorei – mentira, só um pouco. Comecei a entender, comecei a me amar, amar o próximo. Participei de tudo o tempo todo.
Ganhei uma família.
Ganhei uma irmã, a Kitty.
Entendi a palavra fé.
Hoje, não vivo mais em SP. Vivo em Canela, mas as palavras da Equipe ecoam sempre em mim. Mudei minha vida, mudei o olhar, aprendi perdoar, amar, respeitar. Aprendi o que se chama amor incondicional.
São tantas histórias, claro que me esqueci de muitos. Minha palavra continua sendo gratidão.
Acabei de escrever e vou lembrando de coisas que não falei no texto.
Acho que deveria escrever por capítulos.
Amo vocês.